terça-feira, 9 de março de 2010

Decifrando Djavan

Confesso. Eu gosto de parte da obra de Djavan.

Muito se diz de Djavan...
E muito mais se diz das letras de Djavan.

Poesia, visão metafórica do mundo, catarse ou pura viagem causada por um chazinho, um trelelê?...

Hoje, em um momento de tédio e descanso no trabalho, interpretei a alguns colegas uma das obras mais polêmicas do compositor.

Não resisti... Trago aqui a minha visão da arte djavaniana.

Açaí
Composição: Djavan (claro)

"Solidão de manhã,
Poeira tomando assento
Rajada de vento,
Som de assombração, coração
Sangrando toda palavra sã

A paixão puro afã,
Místico clã de sereia
Castelo de areia,
Ira de tubarão, ilusão
O sol brilha por si

Açaí, guardiã
Zum de besouro um imã
Branca é a tez da manhã (2X)..."

Djavan começa nos dando uma pista de seu estado emocional com 'Solidão de manhã'... O vazio da partida da outra metade. A solidão do ponto de vista de quem acordou sozinho. Teria minha completude partido? Ou estaria na cozinha, fazendo café?

Poeira tomando assento
Rajada de vento,
Som de assombração, coração
Sangrando toda palavra sã

Está claro aqui... O vazio, o medo, o tormento da relação. Poeira tomando assento... As coisas estão se acalmando. Mas ao mesmo tempo a rajada de vento com o som de assombração. Um barulho na cozinha? Talvez... Será minha outra metade mexendo nas panelas? Será um assaltante? Será o saci pererê? (coloco essa figura mitológica no contexto da letra pois a música traz um ar de campo, de vida rural, fazenda ou comunidade pós-hippie em um sítio de Saquarema, no início dos anos 80... Um ar Boca Livre, 14 Bis, um tom de A Cor do Som. ).

Coração sangrando toda palavra sã

A metade realmente pode ter ido embora, depois daquelas verdades que falei. Será que exagerei na sinceridade? Ou será que me arrependi de tê-la mandado a merda quando tentou discutir a relação às 4 da manhã?

A paixão puro afã,
Místico clã de sereia
Castelo de areia,
Ira de tubarão, ilusão
O sol brilha por si

Amor é concretude, paixão é ilusão. E o que mais seria ilusão? Um clã de mulheres gostosas com rabo de peixe... Aquele castelo que construímos no nosso sonho mais Sérgio Naya, que se dissolve na primeira onda (o castelo dele tá lá, sem função, mas tá lá).
Ira de tubarão...
Opa.
Ira de tubarão é ilusão ou foi só para rimar?
Bem, vamos assumir que o tubarão ataca quando vê sangue, não quando tá com raiva... (A Orca atacou a treinadora porque tava com raiva, mas não o tubarão. Tubarões são mais inteligentes e dóceis).

O sol brilha por si.

Aqui ele traz a manhã de volta à cena. Diz que o sol pode brilhar sozinho, ao contrário dele, que só brilha com a outra metade. Ou então, ligou o foda-se pra ilusão. Paixão é o caralho... Eu brilho sozinho e não preciso de você.

Açaí, guardiã
Zum de besouro um imã
Branca é a tez da manhã (2X)...

Chegamos ao refrão mais polêmico e discutido da MPB.
Duas interpretações podem ser feitas, seguindo os caminhos que já foram mostrados...
Primeira versão:
A outra metade realmente estava na cozinha, preparando um açaí pra mim... Puxa, como você adivinhou, minha guardiã? Neném... Minha amada, tchutchu, bizuquinha... Besourinha. Zummm... Quero viver a vida com você, assim, grudado, como um imã... Você, minha branquinha! Branca como essa manhã maravilhosa em Saquarema!...

Segunda versão:
Foda-se pra ilusão. Paixão é o caralho... Falei umas verdades e ela foi embora. Agora o sol brilha forte e eu tô felizão. Vou tomar esse açaí que a Nastácia (pra remeter ao saci pererê e ao sítio) preparou pra mim aqui na cozinha (o barulho era dela). Hum, delícia de açaí... Sai, besouro chato! Fica zumbizando em cima do meu açaí... E olha ali, um imã de geladeira! Zum de besouro, um imã. É pau, é pedra, é o fim do caminho... E como tá fazendo sol! Branca é a tez da manhã... Já que a tez da Nastácia não é branca.
Fui... Vou fumar um baseado na praia com o Serguei.

Fato consumado. Djavaniei.
E assim, comprovo que é simples entender qualquer verso djavaniano.
Basta querer... O mundo é vão
E tudo é só um oco absurdo.

OBS: Voltando ao tubarão... Descobri!
O tubarão ataca rápido.
A paixão acaba rápido.

Um comentário:

Boo disse...

"bochecheando" o que há de bom:

numa mesma música

"clã de sereia, ira de tubarão e zum de besouro"....

explicação óbvia:

o açaí de Djavan tava "batizado", com "coisa", ele sijogou na onda e escreveu essa belezura..

bjs, Aninha